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Maria Felipa de Oliveira

Data Escolhida: 04 de Julho de 1873
Assunto: Maria Felipa de Oliveira

Maria Felipa de Oliveira retratada por
Filomena Orge com base em relatos
orais.
Maria Felipa de Oliveira nasceu na Ilha de Itaparica, a maior ilha da Baía de Todos os Santos – Salvador/BA. Infelizmente é desconhecida a data de seu nascimento. Morreu em 04 de Julho de 1873 (em alguns escritos seria 04 de Janeiro). A “Heroína Negra da Independência” é assim que Maria Felipa de Oliveira é conhecida pela população da Ilha de Itaparica.

Nasceu escrava, mas depois de liberta colocou a liberdade como o valor maior de sua vida. Por isso, trabalhou desde cedo coletando mariscos, aprendeu a luta da capoeira para brincar e se defender, e queria um Brasil livre da dominação portuguesa, responsável pela escravização do povo africano, dos seus avós, de sua mãe, e de seu pai.

Descendente de negros escravizados, vindos do Sudão, segundo relatos, ela viveu na Ponta das Baleias, no Convento, casarão que tinha esse nome “porque abrigava os que só tinham de seu o sol e a lua”. É descrita como uma negra alta e forte, que vestia saias rodadas, bata, torso e chinelas.

Ao deixar o Brasil (1821), Dom João VI, prevendo que não tardaria a emancipação da Colônia, dissera a seu filho, Pedro de Alcântara: “…Antes fique para ti o Brasil, que para um desses aventureiros”. Dom Pedro I seguiu a recomendação e proclamou a Independência no dia 7 de setembro de 1822. Mas a aceitação da proclamação imperial não foi tão simples. Houve resistência dos portugueses aqui radicados, especialmente no Maranhão e na Bahia.

Joana Angélica
No território baiano, as lutas foram bastante acirradas, do litoral ao interior. Revelaram o destemor de guerreiras como Maria Quitéria e Joana Angélica, desde então homenageadas e festejadas nos livros de História. Porém, uma grande lutadora ficou esquecida por quase dois séculos, tanto nos festejos oficiais como na historiografia.

Maria Quitéria
Maria Felipa de Oliveira era marisqueira, pescadora e trabalhadora braçal, liderou um grupo de 200 pessoas, entre mulheres negras, índios tupinambás e tapuias nas batalhas contra os portugueses que atacavam a Ilha de Itaparica, a partir de 1822.

Festejou o Grito de Pedro I e, quando os portugueses pegaram em armas para que o Brasil continuasse sendo Colônia, engajou-se na luta pela Independência. De início, acompanhava a movimentação das caravelas portuguesas no período noturno, camuflada nos outeiros da Fazenda 27, em Gameleira (Itaparica). Depois tomava uma jangada para Salvador e passava as informações para o Comando do Movimento de Libertação.

Fortificou as praias com a construção de trincheiras, organizou o envio de mantimentos para o Recôncavo e as chamadas “vedetas” que eram vigias nas praias, feitas dia e noite, a fim de prevenir o desembarque de tropas inimigas além de participar ativamente de vários conflitos.

Folha de Cansanção
Felipa não estava satisfeita com a função de retaguarda. Resolveu partir para o combate. Sabia que uma frota de 42 embarcações se preparava para atacar os lutadores na Capital baiana. Pensou um plano e juntou 40 companheiras para executá-lo. Saíram “vestidas para matar”. Seduziram a maioria dos soldados e seus comandantes e levaram-nos para um lugar ermo. Quando eles, animados, ficaram sem roupa, elas aplicaram-lhes uma surra de cansanção (planta que dá uma terrível sensação de ardor e queimadura na pele); enquanto isso, um grupo incendiava as embarcações usando tochas feitas de palha de coco e chumbo.

Esta ação foi decisiva para uma tranquila vitória sobre os portugueses em Salvador, permitindo que as tropas vindas do Recôncavo entrassem triunfalmente, sob os aplausos do povo, no dia 2 de julho de 1823.

Diferentemente das outras heroínas do panteão do 02 de Julho, Maria Felipa transgrediu os padrões impostos pela sociedade por ser mulher e liderar um grupo armado e, sendo negra e pobre, reivindicar direitos mesmo após o fim da guerra.

Fortaleza de São Lourenço
Na primeira cerimônia de hasteamento da bandeira nacional, após a derrota definitiva dos portugueses, na Fortaleza de São Lourenço em Ponta das Baleias, Felipa e seu grupo do qual são conhecidas Joana Soaleira, Brígida do Vale e Marcolina, invadem a Armação de Pesca de Araújo Mendes, português abastado, e surram o vigia Guimarães das Uvas, evidenciando que as lutas da população itaparicana não haviam terminado.

Esse evento demonstra também a hostilidade que havia entre a população brasileira, principalmente negra e mulata e os lusitanos que resultavam em conflitos denominados mata-marotos.

Ilustração de Maria Felipa a frente do grupo de mulheres
 na luta contra as tropas de Portugal
Foto: marconegro.blogspot.com 
Ela foi um símbolo de resistência, de uma população que mesmo notificada para deixar a ilha pelo governo de Cachoeira, preferiu permanecer e lutar pela sua liberdade. Mesmo sem comprovação documental sobre Maria Felipa, sua existência já estava registrada pela população itaparicana, através da memória que lhe confere diferentes significados, para estas pessoas ela é um personagem real inserido em suas histórias de vida e realidade social.

Em seu livro "A Ilha de Itaparica", publicado em 1942, o historiador Ubaldo Osório Pimentel, cita a figura histórica de Maria Filipa, que também é citada no romance histórico "O Sargento Pedro", do autor Xavier Marques, numa passagem do romance, os homens estão se preparando para um ataque português e Maria Felipa segura uma tocha para que os pescadores cavem uma trincheira, um deles diz “Estou cavando a minha cova…” e é imediatamente retrucado por ela “Cava, mas não p’ra ti.. .” A história de Maria Felipa pode bem ter sido inspiração para a Maria da Fé de “Viva o Povo Brasileiro”, obra de João Ubaldo Ribeiro.

Eny Kleyde Vasconcelos Farias, professora e autora de ‘Maria Felipa de Oliveira: Heroína da Independência da Bahia’ questiona incisivamente o porquê de Maria Felipa ter sido ignorada radicalmente da história. É um livro necessário para os estudiosos da Independência do Brasil na Bahia.

No panteão dos heróis do 02 de julho, é Maria Felipa aquela de mais recente reconhecimento e também aquela sobre quem mais informações são as mais precárias e lacunárias. Trata-se de uma figura legendária, parte da nossa mitologia patriótica, de maior significação para a cultura baiana. Ela representa o extraordinário protagonismo da mulher negra nas lutas pela independência nacional. Diz Eny.

Livro de Eny Kleyde da Quarteto Editora
Este livro se propõe, com sucesso, sistematizar as referências que permitam a imagem e a trajetória dessa heroína Itaparicana. Diante da escassez de evidências históricas sobre a vida e a obra da heroína, a autora colecionou todos os fragmentos de memória preservados no povo de Itaparica. Fixou em documento escrito, as Cartas de Cessão, as lembranças de descendentes da heroína e de populares itaparicanos, de modo a constituir um corpo de evidências sobre Maria Felipa, verdadeiro patrimônio imaterial do povo da Bahia.

A professora Eny Kleyde, diretora do Centro de Estudos de Pós-graduação das Faculdades Integradas Olga Mettig, interessou-se pela história da heroína negra e escreveu a obra citada, apresentando também trabalhos acadêmicos sobre sua participação nas lutas pela Independência no I Congresso de Pesquisadores Negros da Bahia e no Seminário “A abolição inacabada”. O resultado deste exitoso trabalho certamente não foi mais uma biografia. Eny Kleyde conseguiu consolidar um discurso comunitário sobre uma heroína negra, que muito honra a Bahia, e que se constitui em modelo maior de cidadania.

O povo de Itaparica jamais a esqueceu; seus feitos passaram de mãe para filho e filha, uma geração após outra. Maria Felipa continuou sua vida de marisqueira e capoeirista, admirada pelo povo de Itaparica. Com isso, os jornais baianos passaram a divulgar a história da Matriarca da Independência de Itaparica e ela ficou sendo homenageada no dia 2 de julho a partir do ano de 2007.



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